... existe um sentir que é entre o sentir - nos interstícios da matéria primordial está a linha de mistério e fogo que é a respiração do mundo, e a respiração contínua do mundo é aquilo que ouvimos e chamamos de silêncio.

(Clarice Lispector)

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Escrevendo sem escrever

Crise de inspiração, ou coração vazio?
Essa falta de escrever tá começando a me intrigar.
Nada a dizer, ou tanto a esconder?
O corpo em silêncio, um beijo esquecido,
um dia a menos para amar.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

"Liberdade" - Sophia Andresen

Aqui nesta praia onde
Não há nenhum vestígio de impureza,
Aqui onde há somente
Ondas tombando ininterruptamente,
Puro espaço e lúcida unidade,
Aqui o tempo apaixonadamente
Encontra a própria liberdade.


Sophia de Mello Breyner Andresen

domingo, 8 de novembro de 2009

Sangue e Vida

[Este texto já foi postado no blog, mas acho que alguns textos merecem um repeat, como fiz com o "Stormy Blues"]

Porque preciso de algo novo.
Porque preciso escrever uma história nova é que aqui me encontro, papel e caneta, sangue em tinta. Minha vida como uma folha em branco, vou traçando rascunhos daquilo que penso ser e que sonho ter. E sem preceber, nos rascunhos vou me desenhando e experimentando a delícia e o torpor de estar vivo. Meu sangue ferve a cada novo traço e já não posso mais voltar. Nunca passarei estes versos a limpo, pois a tinta é vermelha e viscosa demais. Porque preciso de algo novo, vou rabiscando um pouco mais, traço após traço, até que não haja mais sangue ou espaços brancos na folha, o que acabar primeiro. Porque preciso escrever uma história nova, quero palavras que possam inventar outras de mim, cada uma com mais vigor que a última, cada última tendo atingido o ápice dos sentidos e suas paixões borbulhantes. Porque quero criar, faço surgir devaneios, e deles poesias de uma vida acontecendo em vermelho, intensa a todo instante na sua beleza quente, imagem do impulso incansável de ser que me invade, me inunda, me transborda.

sábado, 7 de novembro de 2009

Primeiro Andar - Los Hermanos

(tô ouvindo muito Los Hermanos ultimamente... poesia de qualidade sem igual, que me toca profundo e quieto, silêncio de estrela brilhando infinita na noite serena.)

"Já vou, será
eu quero ver
o mundo eu sei
não é esse lá

por onde andar
eu começo por onde a estrada vai
e nao culpo a cidade, o pai

vou lá, andar
e o que eu vou ver
eu sei lá

não faz disso esse drama essa dor
é que a sorte é preciso tirar pra ter
perigo é eu me esconder em você
e quando eu vou voltar, quem vai saber

se alguem numa curva me convidar
eu vou lá
que andar é reconhecer
olhar

eu preciso andar
um caminho só
vou buscar alguém
que eu nem sei quem sou

Eu escrevo e te conto o que eu vi
e me mostro de lá pra você
guarde um sonho bom pra mim

eu preciso andar
um caminho só
vou buscar alguém
que eu nem sei quem sou"




"AAAAhhh, se o que eu sou
É também o que eu escolhi ser
aceito a condição

Vou levando assim
Que o acaso é amigo do meu coração
Quando falo comigo, quando eu sei ouvir..."

Los Hermanos - O Velho e o Moço

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Medo

Eu devia estar bem feliz, não devia? E porque não estou? Eu me sinto aliviada, claro... E estou ansiosa também... Mas é como se tudo pudesse ruir num piscar de olhos. É como as coisas acontecem geralmente pra mim. Ou como eu acho que elas acontecem. O que eu acredito, o que eu quero, o que eu consigo, tudo escapa da minha mão como água, tudo é tão difícil de manter como o vento. Então acho que é um pouco de medo de que tudo isso não seja real e seja tirado de mim. Ou como se essa conquista fosse uma mentira que estivesse prestes a ser descoberta: estou num palco e serei desmascarada a qualquer momento. Tudo é uma grande farsa, e logo todos estarão apontando seus dedos sujos e acusadores, rindo da minha cara patética de desamparo e choro. No dia seguinte ninguém mais se lembrará de nada e restarei só, com meus cacos pra juntar. De novo.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Pareça e Desapareça - PAULO LEMINSKI

(Foto: "A fleeting moment" por Larissa Felsen)


Parece que foi ontem.
Tudo parecia alguma coisa.
O dia parecia noite.
E o vinho parecia rosas.
Até parece mentira,
tudo parecia alguma coisa.
O tempo parecia pouco,
e a gente se parecia muito.

A dor, sobretudo,
parecia prazer.
Parecer era tudo
que as coisas sabiam fazer.
O próximo, eu mesmo,
Tão fácil ser semelhante,
quando eu tinha um espelho

pra me servir de exemplo.
Mas vice versa e vide a vida.
Nada parece com nada.
A fita não coincide
com a tragédia encenada.
Parece que foi ontem.
O resto, as próprias coisas contem.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Insight

No centro onde todas as coisas convergem.
É lá que te acharei, completo, seguro, nítido, à espera.
Nem mesmo saberás da iminência de uma coisa completamente diferente do que imaginavas pra esse momento. Como se segurasses uma fruta que não lhe parece atraente, mas tem um sabor muito doce, que só descobres se encaras tua recusa e te rendes à primeira mordida. Ou o contrário, quando pensas que a fruta bonita e reluzente será também suculenta, e a descobres oca e vazia.
É assim que acontecerá. Sem situações perfeitamente combinadas pelo acaso, sem aquele primeiro olhar que anuncia uma coisa profunda e bela. Quando chegar será apenas uma questão de escolha, de experimentação, sem artifícios, sem sinais, sem ilusões. Algo se recostando de mansinho, à primeira vista apenas comum, nem bom nem desastroso. Virá como um presente escondido debaixo da cama, descoberto talvez um pouco tarde mas, se reparares bem, se abrirá na hora certa. Na justa hora em que o pensamento te atinge e percebes que tudo o que sua alma buscava frenética e insistentemente estava bem à frente do seu nariz. Pensarás que a situação chega a ser cômica e patética, tudo tão claro e óbvio que te sentirás um tolo por não o ter alcançado antes.
E de repente tudo fará sentido, tudo será absurdamente nítido, completo, seguro. Sentirás toda a sua vida convergendo para aquele preciso momento, à beira de um abismo, e te tornarás completamente livre, no centro do mundo, de onde emana as coisas belas e simples e corriqueiras e perfeitas. E num último respirar profundo, barços abertos e receptivos à vida, saltarás seguro, nítido e completo, em direção ao desconhecido que não é nada senão nosso próprio ser espelhado nos olhos claros e calmos do outro.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

AFINAL - Álvaro de Campos

Afinal, a melhor maneira de viajar é sentir.
Sentir tudo de todas as maneiras.
Sentir tudo excessivamente,
Porque todas as coisas são, em verdade, excessivas
E toda a realidade é um excesso, uma violência,
Uma alucinação extraordinariamente nítida
Que vivemos todos em comum com a fúria das almas,
O centro para onde tendem as estranhas forças centrífugas
Que são as psiques humanas no seu acordo de sentidos.

Quanto mais eu sinta, quanto mais eu sinta como várias pessoas,
Quanto mais personalidade eu tiver,
Quanto mais intensamente, estridentemente as tiver,
Quanto mais simultaneamente sentir com todas elas,
Quanto mais unificadamente diverso, dispersadamente atento,
Estiver, sentir, viver, for,
Mais possuirei a existência total do universo,
Mais completo serei pelo espaço inteiro fora.
Mais análogo serei a Deus, seja ele quem for,
Porque, seja ele quem for, com certeza que é Tudo,
E fora d'Ele há só Ele, e Tudo para Ele é pouco.

Cada alma é uma escada para Deus,
Cada alma é um corredor-Universo para Deus,
Cada alma é um rio correndo por margens de Externo
Para Deus e em Deus com um sussurro soturno.

Sursum corda! Erguei as almas! Toda a Matéria é Espírito,

Porque Matéria e Espírito são apenas nomes confusos
Dados à grande sombra que ensopa o Exterior em sonho
E funde em Noite e Mistério o Universo Excessivo!
Sursum corda! Na noite acordo, o silêncio é grande,
As coisas, de braços cruzados sobre o peito, reparam

Com uma tristeza nobre para os meus olhos abertos
Que as vê como vagos vultos noturnos na noite negra.
Sursum corda! Acordo na noite e sinto-me diverso.
Todo o Mundo com a sua forma visível do costume
Jaz no fundo dum poço e faz um ruído confuso,

Escuto-o, e no meu coração um grande pasmo soluça.

Sursum corda! ó Terra, jardim suspenso, berço
Que embala a Alma dispersa da humanidade sucessiva!
Mãe verde e florida todos os anos recente,
Todos os anos vernal, estival, outonal, hiemal,
Todos os anos celebrando às mancheias as festas de Adônis
Num rito anterior a todas as significações,
Num grande culto em tumulto pelas montanhas e os vales!
Grande coração pulsando no peito nu dos vulcões,
Grande voz acordando em cataratas e mares,
Grande bacante ébria do Movimento e da Mudança,
Em cio de vegetação e florescência rompendo
Teu próprio corpo de terra e rochas, teu corpo submisso
A tua própria vontade transtornadora e eterna!
Mãe carinhosa e unânime dos ventos, dos mares, dos prados,
Vertiginosa mãe dos vendavais e ciclones,
Mãe caprichosa que faz vegetar e secar,
Que perturba as próprias estações e confunde
Num beijo imaterial os sóis e as chuvas e os ventos!

Sursum corda! Reparo para ti e todo eu sou um hino!
Tudo em mim como um satélite da tua dinâmica intima
Volteia serpenteando, ficando como um anel
Nevoento, de sensações reminescidas e vagas,
Em torno ao teu vulto interno, túrgido e fervoroso.
Ocupa de toda a tua força e de todo o teu poder quente
Meu coração a ti aberto!
Como uma espada traspassando meu ser erguido e extático,
Intersecciona com meu sangue, com a minha pele e os meus nervos,
Teu movimento contínuo, contíguo a ti própria sempre,

Sou um monte confuso de forças cheias de infinito
Tendendo em todas as direções para todos os lados do espaço,
A Vida, essa coisa enorme, é que prende tudo e tudo une
E faz com que todas as forças que raivam dentro de mim
Não passem de mim, nem quebrem meu ser, não partam meu corpo,
Não me arremessem, como uma bomba de Espírito que estoira
Em sangue e carne e alma espiritualizados para entre as estrelas,
Para além dos sóis de outros sistemas e dos astros remotos.

Tudo o que há dentro de mim tende a voltar a ser tudo.
Tudo o que há dentro de mim tende a despejar-me no chão,
No vasto chão supremo que não está em cima nem embaixo
Mas sob as estrelas e os sóis, sob as almas e os corpos
Por uma oblíqua posse dos nossos sentidos intelectuais.

Sou uma chama ascendendo, mas ascendo para baixo e para cima,
Ascendo para todos os lados ao mesmo tempo, sou um globo
De chamas explosivas buscando Deus e queimando
A crosta dos meus sentidos, o muro da minha lógica,
A minha inteligência limitadora e gelada.

Sou uma grande máquina movida por grandes correias
De que só vejo a parte que pega nos meus tambores,
O resto vai para além dos astros, passa para além dos sóis,
E nunca parece chegar ao tambor donde parte ...

Meu corpo é um centro dum volante estupendo e infinito
Em marcha sempre vertiginosamente em torno de si,
Cruzando-se em todas as direções com outros volantes,
Que se entrepenetram e misturam, porque isto não é no espaço
Mas não sei onde espacial de uma outra maneira-Deus.

Dentro de mim estão presos e atados ao chão
Todos os movimentos que compõem o universo,
A fúria minuciosa e dos átomos,
A fúria de todas as chamas, a raiva de todos os ventos,
A espuma furiosa de todos os rios, que se precipitam,

A chuva com pedras atiradas de catapultas
De enormes exércitos de anões escondidos no céu.

Sou um formidável dinamismo obrigado ao equilíbrio
De estar dentro do meu corpo, de não transbordar da minh'alma.
Ruge, estoira, vence, quebra, estrondeia, sacode,
Freme, treme, espuma, venta, viola, explode,
Perde-te, transcende-te, circunda-te, vive-te, rompe e foge,
Sê com todo o meu corpo todo o universo e a vida,
Arde com todo o meu ser todos os lumes e luzes,
Risca com toda a minha alma todos os relâmpagos e fogos,
Sobrevive-me em minha vida em todas as direções!

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Sobre a paixão

Vida sem paixão é morte aos poucos.

Amizade sem paixão é banal.
Vício sem paixão é hábito.
Amor sem paixão vira rotina, não há surpresa, é previsível
(o dia, os gestos, os olhares, as palavras).
Paixão é uma intensidade no fazer as coisas
Que impulsiona, estimula.

Dia sem paixão é cinza.
Olhar sem paixão é apatia, não brilha.
Correr sem paixão é inútil, não te leva a nenhum lugar.
Falar sem paixão é esconder o que se quer dizer.
Melancolia é a paixão da tristeza.

Paixão é querer ser novo
Em tudo o que se faz
E querer ter de novo tudo e mais.

Sorrir sem paixão não é.
Sentir com paixão é experimentar.

Não ter paixão me esvazia.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Um dia cinza.

Tenho dias bons, mas tem dias que eu queria que não existissem, ou que eu passasse por eles meio adormecida, entorpecida, pra não sentir tanta dor.
Hoje está um dia cinza. As cores são boas para definir o humor. Quando tudo está bem, as cores geralmente são quentes, amarelos, laranjas, vermlhos, cores vivas, esfuziantes. Quando se está calmo ou tranquilo, as cores são azuis, verdes e suas variações. Quando se está inclinada à tristeza ou à melancolia, tudo aparece em tons de cinza.
A vontade de chorar me invade muito forte, como há dias não sentia. Uma angústia em nó justo e cego no meu peito. Há algo lá fora que me espera, que aguarda de mim um ímpeto de força e de luta que não consigo encontrar. Uma porta, um caminho, uma saída? Tudo é tão embaçado como neblina de serra, densa e fria.
O céu teve muitas inconstâncias hoje também, eu estive a observá-lo. Ora se abria, ora se fechava. Ora as nuvens se tingiam de laranja e dançavam lentas, ora se juntavam numa massa cinza. O azul apareceu por alguns minutos, mas a chuva não deu as caras desde a manhã. Minhas lágrimas bastaram para umedecer o clima.
Tenho me sentido tão impotente, tão presa num movimento repetitivo que não me leva a lugar nenhum... Tento me alegrar, mas essa angustia no peito vai crescendo, crescendo e ficando maior que eu. Não consigo fazer nada. Às vezes tenho até vontade, mas não consigo.


*R . diz:
-Se tem vontade porque não consegue?
*T . diz:
-não sei... é estranho...
*R . diz:
-O que você tem vontade de fazer quando ela aparece?
*T . diz:
-a angustia ou a vontade de fazer coisas?
*R . diz:
-Não, a vontade, é de fazer o que?
*T . diz:
-sei lá, fazer coisas novas... sair, passear, ir num parque, no cinema, conhecer gente... ou experimentar uma aula de dança, mexer o corpo... e coisas mais a longo prazo, trabalhar, descobrir uma carreira nova e excitante, estudar, mudar de casa, ser indepentende... são muitas coisas, mas ao mesmo tempo elas parecem estar tão longe de mim, não sinto que posso consegui-las.
-to sendo estranha? ou exagerando? sendo dramática?


Dia cinza é dia de se embrenhar nos poços dos poços sem fins...

"Primeiro você cai num poço. Mas não é ruim cair num poço assim de repente? No começo é. Mas você logo começa a curtir as pedras do poço. O limo do poço. A umidade do poço. A água do poço. A terra do poço. O cheiro do poço. O poço do poço. Mas não é ruim a gente ir entrando nos poços dos poços sem fim? A gente não sente medo? A gente sente um pouco de medo mas não dói. A gente não morre? A gente morre um pouco em cada poço. E não dói? Morrer não dói. Morrer é entrar noutra. E depois: no fundo do poço do poço do poço do poço você vai descobrir quê. " (Caio Fernando Abreu - Nos Poços)


quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Para encontrar a justa forma do que se quer dizer.

olhos fechados
respirar profundo
mãos descansando nas pernas
pés tocando o chão
coluna ereta
cabeça erguida
não pense em nada
respirar profundo outra vez
soltar o ar devagar
apensa sinta
deixe passra o tremor do corpo
deixe sossegar as vozes
deixe calar as palavras
deixe desacelerar o coração

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Helena Armond - minha nova descoberta no mundo da poesia.

através do muro
através da porta
através dos sons
do jardim da horta
através do grito
através da força
do ser tão velha
apesar de moça
através da fome
do acontecer
o tédio o monstro
que é o morrer
através do tempo
que me consome
a data a marca
que ferra o nome
através das folhas
vistas de topo
o que forra o chão
tropical e oco
através de um fio
que amarra a lua
de um pôr-do-sol
que incendeia a rua
através da cama
de uma outra chama
de uma fruta doce
de uma idéia insana
através da carta
que me revela
Londres plena
infrene e bela
através do sem
querer mais nada
engulo o mundo
aqui sentada.


(in: Corredor de Espera)

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Amor

Eu só queria que viesse e se demorasse, talvez um chá, um café, uns cigarros, umas histórias banais. Que se detivesse nos meus cabelos emaranhados, nos meus lençóis li-la-ses, nas minhas cicatrizes, nas fotos, nos sons, cheiros e cores desse quarto que abriga as minhas insônias, minha euforia, meu sufoco, meu sossego, meus apelos silenciosos, minhas orações sem palavras, minhas imagens distorcidas, meu choro abafado, minha discreta melancolia. Queria que tornasse meu riso mais solto, que viesse como chuva fina no asfalto quente, espesso e morno, cinza denso. Queria que viesse com o pôr-do-sol, laranja vivo, e...
Queria que viesse de novo aquela dança e aquele dia... aquele qual? Não importa, eu só queria.
Acalma teu corpo. Tudo a seu tempo.

Los Hermanos - O Pouco que sobrou





















Eu cansei de ser assim
Não posso mais levar
Se tudo é tão ruim
Por onde eu devo ir?
A vida vai seguir
Ninguém vai reparar
Aqui neste lugar
Eu acho que acabou
Mas vou cantar
Pra não cair
Fingindo ser alguém
Que vive assim de bem

Eu não sei por onde foi
Só resta eu me entregar
Cansei de procurar
O pouco que sobrou
Eu tinha algum amor
Eu era bem melhor
Mas tudo deu um nó
E a vida se perdeu
Se existe Deus em agonia
Manda essa cavalaria
Que hoje a fé
Me abandonou


Crédito da Foto: Agarrado à fé de Bruno Silva em Olhares.com

domingo, 16 de agosto de 2009

Torpor

Despertar de um longo período de ausência.
E nos braços da sorte, a entrega.
Ser levada a destinos incertos,
E da morte o que se espera.
Num dia talvez não tão distante,
descobrir que a vida é suave aquarela.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Corpo Estranho


Um olho no espelho
E penso -
Quem sou eu?

Um corpo inchado
Uns olhos tensos
O inverno dentro.

Que figura disforme!
Que matéria ingrata!
Que tristeza cinza!

Dentro do peito
O coração palpita.
Uma lágrima nos reconcilia.






segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Living in a glass house

Ai, como você me dói ás vezes... É uma coisa muito aguda que me fere, não ser suficiente pra alguém. Colocar certos medos e expectativas acima do que poderia ser algo bonito de verdade. E por isso não ser capaz de me imiscuir na vida de uma pessoa, perdendo a possibilidade de transformar duas existências incompletas em uma experiência libertadora.


Radiohead - Life in a Glass House

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Pequeno excerto de Caio Fernando Abreu

Fonte da foto: Nus pés de Tirrita em Olhares.com

"Preciso de você que eu tanto amo e nunca encontrei. Para continuar vivendo, preciso da parte de mim que não está em mim, mas guardada em você que eu não conheço. Tenho urgência de ti, meu amor. Para me salvar da lama movediça de mim mesmo. Para me tocar, para me tocar e no toque me salvar. Preciso ter certeza que inventar nosso encontro sempre foi pura intuição, não mera loucura. Ah, imenso amor desconhecido. Para não morrer de sede, preciso de você agora, antes destas palavras todas cairem no abismo dos jornais não lidos ou jogados sem piedade no lixo. Do sonho, do engano, da possível treva e também da luz, do jogo, do embuste: preciso de você para dizer eu te amo outra e outra vez. Como se fosse possível, como se fosse verdade, como se fosse ontem e amanhã."

sábado, 18 de julho de 2009

segunda-feira, 13 de julho de 2009

"E tudo que ofereço é meu calor, meu endereço"



Sem pressa. Sem compromissos. Sem preocupações.
É uma fenda no tempo, estar com os amigos.

O mundo lá fora chovia suas dores e de dentro do apartamento branco ríamos das nossas. Dançávamos as músicas do passado numa doce nostalgia. 7 pessoas. 7 dançarinos numa cidade enorme. 7 caminhos diferentes para atravessá-la. Juntos numa casa de energia branca, soltos e relaxados pelo calor do álcool e do encontro. Um tempo suspenso, num espaço também suspenso, alguns metros acima do chão.

Uma lua cheia se despedia nessa noite.

sábado, 11 de julho de 2009

Sampa, minha cidade querida e cinzenta... Que a chuva que cai sobre suas ruas possa levar embora as minhas incertezas....




São 4h27 da madrugada quando começo a te escrever.
Começou a chover de novo,
e com uma intensidade que me atrai muito,
me tira dos lençois e da moridez.
Sempre gostei da chuva,
principalmente na madrugada.

Penso em tantas coisas pra te dizer,
pra justificar tudo e não consigo formular nada.
A verdade é que eu não sei de nada e nunca saberei.
Você gosta de mim e me entende
de um jeito que nenhuma pessoa nesse mundo é capaz,
e isso me é muito atraente.
E eu gostei disso, e eu deixei as coisas irem além.
Eu queria que as coisas fossem além,
assim como vc queria.
Mas agora tudo parece desconexo.

Quero te ver,
quero conversar olhando nos seus olhos.
Porque assim não terei teclas
que possam deletar minhas palavras.
E tudo parecerá mais real.

sábado, 4 de julho de 2009

um dia
depois de longa jornada
olharemos para trás:

um respirar profundo no peito
e uma certeza de que
a escuridão também é fugaz

terça-feira, 30 de junho de 2009

Busca

Eu te procuro às cegas, no aroma acre do vinho e na neblina densa de um entardecer de inverno. Caçando seus rastros escassos, buscando-te nas entrelinhas de um dia tedioso. Anseio pelas chamas do seu toque e sua voz aveludada, seu sorriso luminoso e sua secreta habilidade de me capturar nas minhas palavras ariscas.

O amor é a beleza e o segredo de um mistério maior.

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Elegia

A poesia acontece quando menos se
espera batendo na sua porta
urgente e explosiva transformando
dores em cores flores sabores
amores pueris em promessas sutis
os dias iguais em belezas rimadas
ritmadas renovadas reinventadas
o grito na garganta perpetuado
apelo de mãos trêmulas e
coração desgastado em
ferrugens ruidosas e
cheiros ardentes pungentes
cantos que se não calo
me consomem.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Comentário em vídeo do Radiohead no YouTube:

"On this day and every other you must listen to Radiohead , they will uplift your spirit and make you wonder at the beauty of it all with effortless ease like dropping a glass to the floor , this is the band that will be remembered as the finest of our generation"

I couldn't agree more.

http://www.youtube.com/watch?v=8nTFjVm9sTQ&feature=related

sexta-feira, 19 de junho de 2009

INTERROMPIDA

E aquela flor que tão bonita se exibiu agora está assim, desgastada, anestesiada pela intensidade de tudo que lhe aconteceu, de tudo que viu e todos os ventos que suas pétalas enfrentaram... E também pela intensidade da ruptura tão brusca que se deu em sua vida, quando aquelas mãos ásperas lhe arrancaram do galho que a sustentava, o galho que lhe tinha feito crescer e desabrochar...
Agora, assim solta, assim leve, assim só, vagueia indecisa entre o ir, o vir, o não ser... o que vai ser agora?

E de tão desesperada, sangra...





sábado, 13 de junho de 2009

terça-feira, 9 de junho de 2009

Lua Cheia

Estar aberto à noite como se vivêssemos um conto pulsante, uma crônica viva. Entregar-se à fenda do espaço-tempo onde tudo que aflora, tudo que a boca prova aflita, é desejo possível, amor suspenso, virtualidade brutal.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Nuvens (1) - Jorge Luis Borges

Não haverá uma só coisa que não dê idéia
de uma nuvem. O são as catedrais
de vasta pedra e bíblicos cristais
que o tempo renderá. O é a Odisséia,
que muda como o mar. Algo há distinto
cada vez que a abrimos. O reflexo
de teu rosto já é outro no espelho
e o dia é um duvidoso labirinto.
Somos os que se vão. A numerosa
nuvem que se desfaz no poente
é nossa imagem. Incessantemente
a rosa se converte em outra rosa.
És nuvem, és mar, és olvido.
És também aquilo que está perdido.

terça-feira, 26 de maio de 2009

Mundo, mundo, vasto mundo. Queria conhecê-lo, desvendá-lo, deliciar-me com sua beleza, regozijar-me nas vastas possibilidades da minha condição humana ao transformá-lo.
Ao invés disso, continuo aqui presa, parada, estática, sem conseguir ir pra frente ou pra trás, sem esperança no futuro, e sem sorrisos no agora. Presa por estes laços sociais que me sufocam, pela falta de oportunidades, sem conseguir sentir a força deste impulso vital de conhecimento e plenitude que me moveria, se tudo estivesse mais claro, colorido, alegre, vivo.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Será que eu sou tão óbvia que chego a ser desinteressante? Ou será que por me esforçar demais deixo de ser espontânea? Por que é tão relevante o que as pessoas pensam ou querem de mim? O que afinal quero eu que as pessoas pensem sobre mim? E o que sei eu do que as pessoas realmente pensam sobre mim? Porque eu não consigo só.. ser????????????????????????????

sábado, 16 de maio de 2009

Poema ao desconhecido.

À noite ele me aparece e me invade,
me desvenda, me descobre.
Sua voz é como veludo
e suas palavras são fortes,
são intensas, são para mim.
Quando ele me deixa e eu durmo,
nos meus sonhos se misturam
o sol e a lua,
a noite e o dia,
o mistério e o desejo.
Sob o encanto de seu olhar
(que só pressinto, que não vejo)
me sinto como luar sobre o mar:
brilhante, bela, prateada.
Ele é meu sopro de prazer
e para ele estou sempre nua,
exposta, aberta, entregue.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Conversa batida à máquina.

Descascada.
Era assim mesmo que eu me sentia quando ela disse aquela frase. Assim mesmo, rasgada, aberta. Com os meus sentimentos mais vermelhos pra fora, cobertos de visco. Todo aquele grito e aquele gozo contidos.
Era assim que eu me sentia naqueles dia em que sua ausência se fez tão presente, com a palidez dos seus sorrisos cansados, gastos, retalhados.
E ele volta. E tudo é tão igual e desnecessário que dispensamos os fingimentos, toda a palidez outra vez. Outra vez e sempre, novamente. Tão repetitivo assim, cansando as têmporas, mesmo velho ritual. Tudo tão estranhamente entediante, tão rigorosamente ensaiado. Quase tive vontade de rir de minhas próprias fraquezas infantis. Mas me contive. Tive necessidade de provar do velho rito outra vez, na ilusão de atrair dragões.
Que eles viessem e fossem doces. Que mais? Não sei, eles não viriam de qualquer forma. Eu sabia, mas não queria acreditar. Mesmo quando ela disse aquela palavra, Descascada, eu tentei disfarçar e olhar para o lado. Não sei bem mesmo se aquilo tudo era comigo, mas foi naquele momento que eu percebi, eu estava bem mesmo assim desse jeito, e só eu não via. Talvez só não reparasse.
Os dragões não perdoavam a feiúra. Quem sabe talvez esse indecifrável corpo exposto...
E assim, bem devagar e tão pequena, quase imperceptível para tais olhos que de tão aberos estão cegos, senti uma vontadinha de calçar uns sapatinhos vermelhos...


Tão dificil escrever assim, sem fingir ser outra pessoa, sem sentir essa necessidade de ser outro que não eu.


(Dialogando com Caio F., 8 ou 9 de fevereiro de 2006 - texto batido à máquina, numa noite de calor assisense, numa casa amiga deliciosa, com as emoções vivas pulsando na pele feito feridas abertas.)


sábado, 9 de maio de 2009

Stormy Blues

e nessa chuva incessante constante meu pensamento se expande até limites inimagináveis e a luz azul combina bem com esse blues que me faz lembrar você e eu e tudo que rodeava deixando tonto as noites mal dormidas e esse gosto estranho na boca que não me deixa pensar em outra coisa só nessa intensidade louca que você provoca em mim e que eu queria provocar em você também e que tudo isso fosse tão doce como aquele céu de baunilha da cidade terra do nunca e onde nunca aconteceu da gente se beijar assim tão lentamente num momento suspenso as mãos se entrelaçando os hálitos bem perto até as bocas se encostarem devagar e quente e úmido e nos lançar bem alto num salto de um abismo de onde jamais poderíamos retornar para aquela posição confortável de outrora um voô cheio de liberdade e de paixão e de vida uma coisa tão grande que não caberia em mim nem em você e teríamos então que nos tranformar pétalas de flor virando borboletas de vida tão curta que esse beijo nos mataria.


(O primeiro texto publicado nesse blog. Resolvi publicar de novo porque é um dos meus favoritos, um dos mais intensos e pessoais...)

quinta-feira, 7 de maio de 2009

"Depois de uma aula de Ontologia do Capital" ou "Uma Agonia Lenta"

Nos processos alienantes perdemos nossa essência, nossa mais profunda raiz natural, que foi roubada e dominada por conceitos que foram historicamente se consolidando e com isso produzindo essa sensação de estranhamento que sentimos todos os dias, ao cruzarmos as esquinas de um mundo que não é mais expressão da nossa subjetividade, passamos todos os dias por pessoas que produzem nossos desejos e que representam nosso mais diverso universo, mas não nos reconhecemos mais uns nos outros, estamos intrincados numa rede de conexões virtuais que nos torna anônimos para nós mesmos e para o planeta que gira ao nosso redor, indiferente às nossas patologias psicossociais produzidas por um esvaziamento do sentido de nossa atividade cotidiana e estamos portanto nos encolhendo pouco a pouco até virarmos tatus isolados em nossas tocas, ou náufragos de nossa ilha pessoal individual, da qual não podemos mais sair sem que o mundo nos ameace.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Amor, ou o absurdo cotidiano.

Pensar, criar, escrever, falar, questionar, investigar, imaginar. Categorias do mundo das palavras, regentes de nossas abstrações. Sem as palavras, o mundo seria apenas um engodo caótico. Temos necessidade de entender e dar significados às coisas, porque acreditamos que talvez assim seja possível exteriorizar e dar sentidos ao que pensamos sobre nós mesmos.

O amor, por exemplo. Sentir amor deveria ser um gesto, algo tão sutil e leve que não merecia carregar o peso dos signos que atribuímos a essa sensação tão peculiar da humanidade. E durante nossa vida aprendemos que o amor é uma virtude, é a solução de todas as misérias, é a causa única de toda necessidade que temos uns dos outros; é flor, música, poesia, beleza, perfeição. Nascemos sob esse estigma, vivemos esse estigma cotidianamente. É o fardo de nossa condição de seres subjetivados. Compramos o amor em lotes, transformados em versos de canção, em anais de poesia, em comprimidos de barbitúricos, em líquido nos vinhos tintos, em frases melosas de novelas de tv, em filmes em que encontrar e perder e reencontrar o amor depois de tantos acasos absurdos só pode mesmo ser chamado de "comédia romântica". O fardo das muitas palavras ditas sobre o amor nos carregam de sonhos e de ilusões. De possibilidades irrealizáveis X os encontros possíveis.

E assim, no nosso absurdo cotidiano das cidades amontoadas e de pessoas indiferentes, o amor está em toda parte. Ou deveria estar. O amor é coisa que cruza o nosso caminho 15 mil vezes por dia, e pode ser encontrado em cada esquina aos montes. Mas como pode a força mística e incansável do acaso unir dois corpos que dançam desgovernadamente e se procuram sem saber?

Fênix

Sou cinzas de um tempo ido
renascendo no agora.
Das chamas transmuto em paz,
caos de pó e restos
que se refazem e me reinventam.

A transformação em beleza
e força ardente,
o movimento de remoldar o devir,
as reverberações dos sentidos
e as ressonâncias de vontades novas.

As múltiplas existências me atravessam
pois a cada novo ciclo
sou uma vida nova
que se lança no mundo.

Sou poesia, leveza, encanto,
Sou vida, sou fogo, sou renovação.


sábado, 4 de abril de 2009

É, talvez isso de querer escrever com uma certa beleza etéra, algo que transcenda o próprio ato da escrita, seja o que mais me preocupa quando escrevo. Mas é também algo que de certa maneira soa impessoal, inverossímel, como se o que eu estivesse tentando dizer ficasse obscuro, apenas suspeito, nas entrelinhas... sinto que isso me impede de me jogar de verdade na coisa nua e crua do que me impulsiona.

Certa vez li um trecho de Caio Fernando Abreu que dizia: "Pra mim, e isso pode ser muito pessoal, escrever é enfiar um dedo na garganta. Depois, claro, você peneira essa gosma, amolda-a, transforma. Pode sair até uma flor. Mas o momento decisivo é o dedo na garganta."
Isso me faz pensar que eu raramente me arrisco a colocar pra fora toda a gosma mesmo, aquela coisa mais amarga e fedida que está me enjoando. Aquilo que consiste todo o ato da entrega. Tudo sempre tão cheio de floreios, sinuosidades, metáforas, como que pra desviar aquela coisa incômoda que não sabe ser dita.

E daí?? E daí se o que eu desejo te incomoda, te enoja? E daí que meu querer é bizarro, louco, imundo, irreal??

Foda-se você e as suas perguntas. Foda-se você e seu julgamento, seu pré-conceito, seu pudor. Nem tudo é poesia. As coisas também são feias, fétidas, podres. Eu, você e todo o resto.

domingo, 29 de março de 2009

Pra não esquecer jamais.

Tudo numa música...
Todas as sensações
Da raiva à dor
Do choro ao grito
Da calma à revolta
Do leve ao sublime
Do sim ao não...

O verdadeiro artista se revela
Através dos sabores e das cores
Dos medos e erros
Mais humanos
Mais profundos
Mais secretos
Mais obscuros...

Não há o que esconder.
Sob a força de sua voz
Todo odor mais incômodo
Exala a mais desagradável
E insuportável verdade...







Thanks, Radiohead.

sábado, 14 de março de 2009

*

Deitada no quarto à meia luz...
Lá fora há chuva e a vida espera.
Ao som da música todos os mistérios
Se revelam e se pintam,
Para depois se esvaírem em fumaça
Deixando em nós não mais que um aroma.

quarta-feira, 4 de março de 2009

.

Quanto mais eu tento
quanto mais eu quero

quanto mais me custe
quanto mais me suje

quanto mais me irrite
quanto mais eu grite

quanto mais eu corro
quanto mais meu choro

quanto mais a vida
quanto mais saída


tanto mais me iludo
tanto mais me frustro

tanto mais caro
tanto mais barro

tanto mais eu sofro
tanto mais me dói

tanto mais paraliso
tanto mais há para chorar

tanto mais sem sorte
tanto mais a morte