... existe um sentir que é entre o sentir - nos interstícios da matéria primordial está a linha de mistério e fogo que é a respiração do mundo, e a respiração contínua do mundo é aquilo que ouvimos e chamamos de silêncio.

(Clarice Lispector)

terça-feira, 26 de maio de 2009

Mundo, mundo, vasto mundo. Queria conhecê-lo, desvendá-lo, deliciar-me com sua beleza, regozijar-me nas vastas possibilidades da minha condição humana ao transformá-lo.
Ao invés disso, continuo aqui presa, parada, estática, sem conseguir ir pra frente ou pra trás, sem esperança no futuro, e sem sorrisos no agora. Presa por estes laços sociais que me sufocam, pela falta de oportunidades, sem conseguir sentir a força deste impulso vital de conhecimento e plenitude que me moveria, se tudo estivesse mais claro, colorido, alegre, vivo.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Será que eu sou tão óbvia que chego a ser desinteressante? Ou será que por me esforçar demais deixo de ser espontânea? Por que é tão relevante o que as pessoas pensam ou querem de mim? O que afinal quero eu que as pessoas pensem sobre mim? E o que sei eu do que as pessoas realmente pensam sobre mim? Porque eu não consigo só.. ser????????????????????????????

sábado, 16 de maio de 2009

Poema ao desconhecido.

À noite ele me aparece e me invade,
me desvenda, me descobre.
Sua voz é como veludo
e suas palavras são fortes,
são intensas, são para mim.
Quando ele me deixa e eu durmo,
nos meus sonhos se misturam
o sol e a lua,
a noite e o dia,
o mistério e o desejo.
Sob o encanto de seu olhar
(que só pressinto, que não vejo)
me sinto como luar sobre o mar:
brilhante, bela, prateada.
Ele é meu sopro de prazer
e para ele estou sempre nua,
exposta, aberta, entregue.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Conversa batida à máquina.

Descascada.
Era assim mesmo que eu me sentia quando ela disse aquela frase. Assim mesmo, rasgada, aberta. Com os meus sentimentos mais vermelhos pra fora, cobertos de visco. Todo aquele grito e aquele gozo contidos.
Era assim que eu me sentia naqueles dia em que sua ausência se fez tão presente, com a palidez dos seus sorrisos cansados, gastos, retalhados.
E ele volta. E tudo é tão igual e desnecessário que dispensamos os fingimentos, toda a palidez outra vez. Outra vez e sempre, novamente. Tão repetitivo assim, cansando as têmporas, mesmo velho ritual. Tudo tão estranhamente entediante, tão rigorosamente ensaiado. Quase tive vontade de rir de minhas próprias fraquezas infantis. Mas me contive. Tive necessidade de provar do velho rito outra vez, na ilusão de atrair dragões.
Que eles viessem e fossem doces. Que mais? Não sei, eles não viriam de qualquer forma. Eu sabia, mas não queria acreditar. Mesmo quando ela disse aquela palavra, Descascada, eu tentei disfarçar e olhar para o lado. Não sei bem mesmo se aquilo tudo era comigo, mas foi naquele momento que eu percebi, eu estava bem mesmo assim desse jeito, e só eu não via. Talvez só não reparasse.
Os dragões não perdoavam a feiúra. Quem sabe talvez esse indecifrável corpo exposto...
E assim, bem devagar e tão pequena, quase imperceptível para tais olhos que de tão aberos estão cegos, senti uma vontadinha de calçar uns sapatinhos vermelhos...


Tão dificil escrever assim, sem fingir ser outra pessoa, sem sentir essa necessidade de ser outro que não eu.


(Dialogando com Caio F., 8 ou 9 de fevereiro de 2006 - texto batido à máquina, numa noite de calor assisense, numa casa amiga deliciosa, com as emoções vivas pulsando na pele feito feridas abertas.)


sábado, 9 de maio de 2009

Stormy Blues

e nessa chuva incessante constante meu pensamento se expande até limites inimagináveis e a luz azul combina bem com esse blues que me faz lembrar você e eu e tudo que rodeava deixando tonto as noites mal dormidas e esse gosto estranho na boca que não me deixa pensar em outra coisa só nessa intensidade louca que você provoca em mim e que eu queria provocar em você também e que tudo isso fosse tão doce como aquele céu de baunilha da cidade terra do nunca e onde nunca aconteceu da gente se beijar assim tão lentamente num momento suspenso as mãos se entrelaçando os hálitos bem perto até as bocas se encostarem devagar e quente e úmido e nos lançar bem alto num salto de um abismo de onde jamais poderíamos retornar para aquela posição confortável de outrora um voô cheio de liberdade e de paixão e de vida uma coisa tão grande que não caberia em mim nem em você e teríamos então que nos tranformar pétalas de flor virando borboletas de vida tão curta que esse beijo nos mataria.


(O primeiro texto publicado nesse blog. Resolvi publicar de novo porque é um dos meus favoritos, um dos mais intensos e pessoais...)

quinta-feira, 7 de maio de 2009

"Depois de uma aula de Ontologia do Capital" ou "Uma Agonia Lenta"

Nos processos alienantes perdemos nossa essência, nossa mais profunda raiz natural, que foi roubada e dominada por conceitos que foram historicamente se consolidando e com isso produzindo essa sensação de estranhamento que sentimos todos os dias, ao cruzarmos as esquinas de um mundo que não é mais expressão da nossa subjetividade, passamos todos os dias por pessoas que produzem nossos desejos e que representam nosso mais diverso universo, mas não nos reconhecemos mais uns nos outros, estamos intrincados numa rede de conexões virtuais que nos torna anônimos para nós mesmos e para o planeta que gira ao nosso redor, indiferente às nossas patologias psicossociais produzidas por um esvaziamento do sentido de nossa atividade cotidiana e estamos portanto nos encolhendo pouco a pouco até virarmos tatus isolados em nossas tocas, ou náufragos de nossa ilha pessoal individual, da qual não podemos mais sair sem que o mundo nos ameace.